O papel do poder público no enfrentamento da epidemia de HIV/aids na cidade de São Paulo

Sabemos que é dever de todes lidar, de diferentes formas, com a epidemia de HIV/aids e com o enfrentamento dos estigmas acerca do vírus e das populações vulneráveis. O poder público tem responsabilidade fundamental em criar e fazer cumprir políticas públicas para garantir acesso à saúde integral para todas as pessoas, em especial para as juventudes. Para conhecer o cenário dessa atuação na cidade de São Paulo, conversamos com a então vereadora – hoje deputada federal por São Paulo – Erika Hilton.
Por Mariah Eduarda Soares Silva, Vitor Ranieri e Samantha Almeida
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No final de junho de 2022, realizamos uma visita ao gabinete da então vereadora Erika Hilton, que naquele momento cumpria seu mandato na Câmara Municipal da Cidade de São Paulo. Erika Hilton foi escolhida para essa pauta por conta da sua atuação enquanto jovem parlamentar e também por representatividade – afinal, Erika, que é ativista do movimento negro, da causa LGBTQIAP+ e pelos direitos das pessoas periféricas desde a juventude, foi a vereadora mais votada do país, com mais de 50 mil votos na última eleição municipal, marcando a história também como a primeira vereadora trans da cidade. Em 2021, Erika se tornou presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara de São Paulo.
Parte da atuação da parlamentar na Comissão de Direitos Humanos passou por promover discussões sobre o enfrentamento da epidemia de HIV na cidade. em 2021, Erika Hilton promoveu uma audiência pública virtual para discutir políticas públicas para o tratamento e prevenção da aids na capital paulista. Também foram debatidas ações de bem-estar voltadas às pessoas que convivem com o HIV. A atividade reuniu trabalhadores da saúde, ativistas LGBTQIAP+ e da pauta do HIV/aids, representantes de organizações da sociedade civil e outros parlamentares.
A partir de nossos estudos, escuta dessa audiência pública e reflexões que fizemos nas oficinas do projeto, nós a visitamos em seu gabinete para uma conversa sobre o papel do poder público no enfrentamento da epidemia de HIV e outras vulnerabilidades às quais nossa juventude está exposta.
Ao chegar na Câmara Municipal, fomos recepcionades pela sua assessoria; boa parte do grupo nunca havia entrado no prédio da Câmara. O ambiente em que a encontramos era diferente do que imaginávamos: não era cinza como todas as outras salas, os profissionais não estavam de terno e gravata. A sala de Erika Hilton tinha cores que representam as pessoas LGBTQIAP+; não era uma sala padrão, nos sentimos super acolhides no ambiente. Tivemos a oportunidade de conversar com Hilton sobre sua trajetória pessoal e profissional, sobre as juventudes, comunicação, sobre o momento político que vivemos e sobre a questão do HIV/aids. O resultado dessa conversa é o que compartilhamos a seguir:
Agência Pra Brilhar (APB):O que te motivou a seguir o caminho parlamentar?
Erika Hilton (EH): Eu fui expulsa de casa muito cedo, tive que viver nas ruas, viver da prostituição, viver todas as questões sociais como um corpo negro, um corpo de uma travesti no Brasil. Vivendo essas realidades, começo a entender a negação de todos aqueles direitos que eu sofri, vou entendendo que era preciso a organização de uma luta. E aí, foi onde entrei na militância, no ativismo.
Apareço midiaticamente pela primeira vez em 2015, se não me engano. Eu entrei numa briga com uma empresa de ônibus na cidade de Itú, onde vivia, pelo reconhecimento do meu nome social no cartão de transporte escolar. A partir daquele momento, eu comecei um ativismo mais organizado. Depois, fui para a UFSCar, fundo um cursinho pré-vestibular para pessoas trans e travestis por lá e começo uma militância no movimento estudantil.
No movimento estudantil, vou organizando melhor aquilo que já entendia como sendo meu ativismo e militância, que era meio desorganizada. Tentei retornar para a rua algumas vezes, para tentar conversar com aquelas travestis que tinham ficado nas esquinas, para que também fosse despertando nelas um sentimento sobre os direitos que elas tinham — e que eu estava conhecendo agora. Enquanto estava ali, eu também não sabia que tinha aqueles direitos. E aí, começo a perceber que tem um grande déficit no poder público, de pessoas mesmo, que tenham compromisso com as nossas pautas, com as nossas vidas, com os direitos da comunidade LGBT, do povo negro e todos esses grupos dissidentes.
Em 2018, recebi um convite para fazer parte do primeiro mandato coletivo do estado. Eu não achava que pudesse ser política ou que quisesse ser política, porque durante muito tempo pensei que meu ativismo era de ficar gritando, tacar fogo nas coisas, pichar prédio público, do tipo: “eu quero esculhambar, eu quero demolir o sistema”. Mas fui amadurecendo e entendendo: eu não vou demolir o sistema, eu preciso entrar no sistema e, através desse hackeamento, posso ir mudando a realidade das pessoas, a minha realidade. Aí falei: “então tá, acho que vou aceitar esse convite, mesmo a contragosto” — jamais imaginei que aquela loucura fosse ser eleita [risos], eu nunca imaginei que ia dar certo. Era 2018, a gente tinha também uma necessidade muito forte de se contrapor ao bolsonarismo, então era o momento de ter uma narrativa. Fomos eleitas como a 10ª legislatura mais bem votada do estado de São Paulo.
A experiência não atendeu as minhas expectativas, não foi aquilo que eu esperava que fosse, por conta da relação com as outras pessoas que compunham aquele grupo. A gente estava fazendo muitas coisas, mesmo com os desafios dentro da Alesp, em relação às pautas que para nós eram importantes. E aí, eu falei: “Acho que realmente tenho um papel a cumprir na política, um dever, uma responsabilidade, a qual me sinto chamada, convocada. Vou me lançar como vereadora para a cidade de São Paulo”.
APB: Quais são as maiores dificuldades que você enfrenta sendo a primeira parlamentar trans preta de São Paulo?
EH: Olha, uma das primeiras dificuldades foram todos os ataques e ameaças de morte que eu recebi e tenho recebido ao longo da minha chegada ao parlamento. Isso muda a minha dinâmica de vida: eu perco minha liberdade de ir e vir, preciso andar com um carro escuro, segurança, escolta.
O segundo desafio é fazer com que os vereadores compreendam que as minhas pautas não são menos importantes, são pautas tão essenciais como qualquer outra e que esse grupos que eu represento são dignos de direito. Acho que esses são os maiores desafios.
O enfrentamento de conseguir se movimentar enquanto parlamentar, tendo tanto ódio contra você sem que não tenha cometido nenhum crime, nem nada. Só porque fui eleita e quero exercer, cumprir com o meu mandato e fazer com que as pautas caminhem, fazer com que as coisas tramitem aqui dentro. Há uma presença muito forte do conservadorismo, do fundamentalismo, dentro das casas legislativas do Brasil, e a Câmara [de São Paulo] é a maior casa legislativa da América do Sul. Então, assim, a gente tem um agrupamento muito grande desses conservadores aqui dentro, o que dificulta a tramitação de algumas pautas, o desenrolar de algumas demandas. As outras coisas são superáveis.
APB: Como você observa a ausência de pessoas trans nos espaços públicos de poder e como essa ausência atinge especialmente homens trans?
EH: Eu vou começar pelos homens trans, então, porque acho que é uma pauta importante. A gente tem uma invisibilidade dos homens trans e das transmasculinidades na nossa sociedade, mas não só pelo fato de que a sociedade quer torná-los invisíveis; esta é uma pauta que vem surgindo com maior força e com mais expressão agora.
Então, nós temos uma sub-representação de homens trans e de transmasculinidades nos espaços de poder e na sociedade de um modo geral, inclusive dentro da própria comunidade LGBT ou mesmo dentro do próprio movimento trans e travesti, porque quando pensamos em trans e travestis, muitas vezes automaticamente o nosso cérebro se prende em mulheres trans e travestis e exclui homens trans.
Eu tenho tido a preocupação de levantar que essas masculinidades precisam ganhar espaço dentro do debate das masculinidades de um modo geral, mas também dentro do movimento trans, dentro da sigla LGBTQIA+, porque há sim um apagamento desse grupo e há uma ausência dessa representação nos mais diversos espaços. Nos espaços de poder público, então, nós temos uma única representação, mas que, na minha opinião, é mais um desserviço do que um serviço à comunidade.
Porque não é só ser uma pessoa trans: é necessário ter compromisso com a agenda do movimento, é sobre pautas alinhadas com as necessidades das pessoas trans. Então há esse apagamento, mas acho que isso é reflexo do momento em que a pauta das transmasculinidades vai ganhando força. Há cada vez mais agentes que se reconhecem, que querem falar sobre isso e sobre o que deve mudar. Eu espero muito que isso mude ao longo dos anos e que os homens trans, as transmasculinidades, possam ocupar esses espaços de seguridade de direitos, porque são pautas diferentes das mulheres trans, são outras necessidades.
Com relação às mulheres trans e travestis, nós já temos uma maior presença porque estamos mais expostas. Mais expostas à violência, nossa pauta já existe há muito tempo e é muito bem consolidada. Não estou dizendo que as pautas de homens trans surgiram hoje, de forma alguma, as transmasculinidades sempre existiram, assim como as travestis sempre existiram. Ninguém nasce do nada, vira trans do nada. A questão é que esse tema enquanto pauta, enquanto reivindicação social, no que diz respeito às mulheres trans e travestis, estava mais bem colocado e organizado, antes dessa movimentação que os homens trans começaram a fazer de uns anos para cá, inclusive com o João Nery lançando livro.
Então, nós temos uma maior presença, mas ainda muito nesse lugar de marginalidade, de violência, nesses contextos de agressividade. Temos uma presença maior nos parlamentos do país, estamos caminhando, mas ainda somos muito poucas diante do todo.
Eu sou a primeira vereadora nominalmente trans eleita — depois, nós tivemos as co-vereadoras Carolina Iara e Samara Sóstenes, mas eu sou a primeira vereadora trans nominalmente eleita a ocupar uma cadeira na câmara que tem 55 cadeiras. Somos poucas e precisamos avançar.
APB: Qual o histórico da atuação da câmara no enfrentamento da epidemia de HIV/aids? Como a Câmara vê a relevância de você trazer essas pautas?
EH: A primeira coisa que a gente enfrenta muito é a questão do estigma e do desconhecimento, que para mim, enquanto vereadora, estar em uma casa de leis onde tenha vereadores que tenham desconhecimento sobre a questão do HIV/aids é algo absurdo, é chocante, porque nós estamos em 2022. Claro, nós temos esse governo horroroso, que tem desmontado, sucateado… O Brasil era referência no tratamento e agora a gente tem passado por uma série de obstáculos no que diz respeito à pauta do HIV/aids. Essa é uma pauta que os movimentos de saúde já consolidaram informações muito precisas, que tiram qualquer tipo de mistificação. Às vezes, chegamos dentro da câmara e tentamos abordar a questão do HIV/aids, ou até mesmo de outras IST, e temos o desafio de lidar com o estigma, com essa ignorância por desprezo à pauta mesmo, porque acham que não tem que falar sobre HIV/aids. Acham que é uma coisa da promiscuidade, da sodomia, pederastia. Associam o vírus e a doença a uma questão moral.
O maior desafio neste momento, dentro do parlamento, é conseguir romper com as barreiras da estigmatização, do preconceito e da desinformação.
Aí, é claro, no âmbito das políticas públicas, a gente precisa avançar na informação, conscientização e na verba, que muitas vezes as pessoas acham que não. As coisas não estão competindo umas com as outras. Os casos têm suas particularidades e todos merecem atenção do poder público, financiamento e políticas públicas que ajudem a prevenir. Porque às vezes querem falar de HIV/aids no âmbito do legislativo, mas querem falar só em remediar, só quando temos um problema, mas ninguém quer falar sobre a prevenção, uma pauta extremamente importante. Acho que é a pauta que a gente tem mais dificuldade.
Porque quando a gente quer falar de prevenção ao HIV/aids, pensam que a gente quer ensinar as crianças a transar, fazer uma apologia ao sexo, símbolos sexuais, ditadura gayzista, travestista… sei lá o que eles pensam. Então, esse é um baita de um desafio.
APB: O que te desperta a discutir sobre prevenção a ISTs na cidade de São Paulo? Como a gente consegue trazer essas pautas para mais lugares e convocar todas as pessoas para que discutam prevenção?
EH: Precisamos de políticas públicas, eu acho que a gente precisa ocupar a internet e os espaços todos para falar sobre HIV/aids, hackear essa linguagem que acaba se tornando mais acessível para uma parcela maior de pessoas.
Trazer as pessoas para cá, para falar com os vereadores sobre isso. Eu já promovi audiências públicas com relação ao HIV/aids para que as pessoas pudessem falar sobre as vivências delas e suas trajetórias, de seus pontos de vista, do sucateamento das políticas e que os vereadores pudessem ouvir aquilo e se sensibilizarem através disso.
Isso é fundamental, porque a escuta faz com que a gente se sensibilize, a escuta faz com a gente tenha empatia — em alguns casos, em alguns outros a empatia é algo que não se desperta mesmo. Tem gente que é podre por dentro e não há nada que se possa fazer, mas não são todas as pessoas, então isso é importante porque vai movimentando.
Não vamos falar: ‘recolham essas cartilhas de prevenção, destrua a secretaria x, y, z. Usar essas outras plataformas também é uma forma da gente fazer um trabalho, de conseguir dar conta daquilo que o Estado não está fazendo. É claro, com uma capacidade muito menor de atingir todo esse ecossistema, porque o Estado tem capacidade muito maior de conseguir alcançar as pessoas, mas essas são formas, subterfúgios para não deixar que a pauta morra. Para evitar que as pessoas realmente achem que esse é um assunto que não deve ser tratado, que é coisa de LGBT, que é coisa de promiscuidade, que é coisa de não sei o quê.
Eu acho que quando a gente usa essas novas linguagens, a gente faz com que a juventude se interesse mais. Porque uma coisa é você sentar e falar para o jovem: “olha, vamos fazer uma palestra com a vereadora…” — é chato, cansativo, porque nós estamos diante de uma era muito rápida, as pessoas estão movidas pelas telas — o que acho péssimo, mas eu achar é uma coisa, o fato, é outra. Eu posso achar péssimo e dizer “não participarei disso” ou posso achar péssimo e dizer “se é para aí que o mundo está caminhando e eu não tenho o poder de parar o mundo, eu vou tentar fazer disso algo positivo, algo benéfico, tirar algum sentido, porque a ‘merda’ já está dada, já está posta, e não vai ser a minha vontade, o meu querer, que vai parar a problemática de uma sociedade movida a telas”. Eu uso muito essa linguagem aqui no gabinete porque sei que ninguém vai ficar assistindo TV Plenário, TV Câmara, mas preciso me comunicar com a galera que me colocou aqui, que é uma galera jovem, então me utilizo disso e acho que é necessário.
E é isso que vai fazer com que essa pauta vá saindo desse lugar das pessoas não quererem falar por um medo absurdo, como se estivéssemos em 1990 ainda e as pessoas tivessem que lidar com essa pauta com aquele desconhecimento todo. As pessoas vão se familiarizando, naturalizando, normalizando, entendendo que isso é algo que está aí, que existe, que tem tratamento, que pode ser prevenido. Não tem porquê a gente não falar. Muito pelo contrário: é necessário que se diga, que se enxergue, para que haja cada vez melhores tratamentos, cada vez mais oportunidades de acesso, cada vez mais políticas de prevenção. Nós precisamos falar sobre essa pauta. E aí, utilizando isso e fazendo com que a juventude e os mais velhos também se conscientizem da importância, talvez um dia a gente tenha avançado muito enquanto sociedade no que diz respeito à pauta do HIV/aids.
APB: Qual a importância de convocar uma audiência pública? Quais os principais desdobramentos da audiência pública para as discussões sobre as políticas públicas de enfrentamento à epidemia de HIV/aids realizada recentemente?
EH: As audiências foram boas, as pessoas vieram, mas não houve grandes desdobramentos. Eu preparei um documento com algumas ações, porque também, ter tudo na cabeça, a gente não consegue. Mas são muito pequenos os desdobramentos que se dão, porque tem uma ligação muito forte desta pauta com a questão LGBTQIA+, então eles acham assim: “ah, isso aqui é uma pauta dela, que ela quer falar, ela quer tratar os gays dela”.
A gente tem uma dificuldade de fazer com que tudo aquilo que foi dito no âmbito da audiência não seja vinculado, necessariamente, com a pauta LGBT. Tem uma intersecção, claro. Mas essa é uma pauta de saúde e ponto.
Tem um atravessamento pelo gênero, pela sexualidade, pela raça, mas não é uma pauta de gênero, raça ou sexualidade. Há uma dificuldade, um desafio muito grande em fazer entender que essa é uma pauta de saúde e não uma pauta LGBT. Existem pessoas que não são LGBT vivendo com HIV, várias pessoas.
EPB: Para você, qual a importância da juventude dissidente estar engajada em ações afirmativas relacionadas à prevenção ao HIV/aids e outras IST e enfrentamento aos estigmas? Como trazer de volta esses jovens para o protagonismo, depois de 4 anos de sucateamento das políticas públicas?
Eu acho que vai ser um desafio. Acho que a juventude perdeu um pouco a esperança da luta… O que foi a juventude em 2013, 2014, né? A força dos jovens, a mobilização que fizeram para olhar e dizer: “olha onde nós estamos, não valeu de nada”. Eu tenho muito essa sensação, que eles pensam assim.
Eu espero que em 2023 nós tenhamos um outro Brasil, um Brasil diferente, um Brasil melhor, um Brasil sem Bolsonaro. Essa é a nossa meta. O trabalho de base vai ser um trabalho que vai aproximar a juventude: ouvir, fazer com que seja parte do processo, dar esperança, devolver para a juventude o desejo de sonhar, de acreditar no seu país, de acreditar no seu futuro. A gente vai reaproximar a juventude através das políticas públicas, fazendo políticas públicas que incentivem os jovens a se movimentar, indo aos territórios, indo às escolas, incentivando a pesquisa, incentivando a universidade pública de qualidade e aberta, tendo programas para empregar os jovens, para dar qualificação profissional, para que tenham espaços de lazer, de cultura, de arte, de criação, de produção, de contato, de troca. É dessa forma que a gente vai conseguir reaproximar os jovens e fazer com que se engajem nas pautas todas que são importantes e necessárias.
Falar com jovens sobre prevenção e enfrentamento aos estigmas é fundamental. Isso deveria estar dentro das escolas, no processo de formação pedagógica desses alunos. Às vezes, as pessoas têm a ideia de que “imagina, hoje em dia tem camisinha disponível, hoje em dia tem tudo…”, mas a gente sabe que na prática não é bem assim, não é a disponibilidade de preservativo que faz com que as pessoas usem preservativo. Até porque o frisson, aquele quentinho que dá na hora H, aquele babado, com todo aquele sistema endócrino funcionando aos 15, 16, com aquela energia lá em cima, se você não tem um processo de educação dessa juventude para os riscos não só para o HIV/aids, mas para outras ISTs, no caso de pessoas com útero também a prevenção da gravidez, não adianta ter camisinha. E digo isso por experiência própria — ia no posto, eu era uma travesti que me prostituía e tinha uma questão muito forte do uso do preservativo porque tinha contato sexual muitas vezes e quanto mais contato sexual nós temos, mais riscos corremos. E quantas vezes não fiz sexo sem preservativo?
A gente não tem a noção clara da importância, da necessidade, do risco. Esse debate deve ser colocado com naturalidade nos espaços, para a gente realmente ter essa informação. Então, trazer a juventude para esse debate é a tentativa de, primeiro, diminuir o índice de pessoas vivendo com HIV que só tem subido, subido, subido. É fazer com que esses adolescentes entendam e questionem: “Olha, nós temos aqui a realidade. Existem infecções sexualmente transmissíveis, elas estão postas, e nós podemos preveni-las, nós podemos evitá-las. Como nós fazemos isso?”.
Tem todo um trabalho que já é realizado e nós sabemos que existe toda uma base muito bem elaborada de informação. A informação pode mudar o rumo dessa história. Então, é muito fundamental que nós tragamos a juventude LGBT, a juventude negra e juventude periférica para discutir essa questão das ISTs, da gravidez precoce, de tudo isso que pode mudar um pouco a sua vida. Não vai te matar, não vai te destruir, mas vai mudar um pouco ali a ordem das coisas, e que talvez você possa prevenir e evitar essa mudança com informação.
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Erika Hilton elencou as ações que vêm sendo implementadas na Câmara durante seu mandato:
- O direcionamento de esforços e verbas através de emendas parlamentares para o atendimento de prevenção das ISTs, conscientização sobre HIV/aids (também para outras pautas da área da saúde) e redução de danos;
- A realização de duas audiências públicas pela Comissão de Direitos Humanos e os ofícios gerados a partir de demandas dessas audiências que foram encaminhados às secretarias competentes;
- O Projeto de Lei 694, de autoria da parlamentar, que institui o serviço de Casas de Acolhimento Institucional de jovens e adolescentes LGBTQIAP+ em situação de vulnerabilidade e vivendo com HIV no município de São Paulo e dá outras providências a partir do princípio da não discriminação e da dignidade da pessoa humana;
- E o Projeto de Lei 815, que autoriza o poder executivo a criar a categoria de Agente Redutor de Danos e atender a demanda no apoio a pessoas que se encontram em situação de abuso de substâncias como álcool e drogas.
Aqui você encontra um documento que a assessoria de Erika Hilton preparou para a nossa turma com um histórico de atuação dos vereadores de São Paulo no enfrentamento da epidemia de HIV/aids na cidade de São Paulo.
Assista a íntegra da audiência pública “Políticas Públicas para HIV/aids no Município de São Paulo”:
